29.9.12

Contato

mãos que lavam
dedo que abre
olho que gruda
lente que arde
pra lágrima cair.

26.9.12

Martes trece

Algumas coisas nessa vida nascem e morrem sem sentido nenhum, a não ser que alguém, antes de enlouquecer procurando o sentido, atribua um sentido qualquer para aliviar a mente. A quarta-feira, por exemplo, é um dia comum e agitado. É o dia em que é proibido cair feriado. É o dia em que me preocupo em terminar os afazeres atrasados dos primeiros dias da semana e em querer adiantar os do final de semana. Não concluo nenhum, obviamente, mas pelo menos ocupo a mente. A quinta-feira, por sua vez, é um dia especial porque precede a sexta, e quem tem vida social perde a quinta pensando no que vai fazer na sexta ou no sábado à noite. Geralmente vão aos mesmos lugares, fazer as mesmas coisas, falar dos mesmos assuntos, com as mesmas pessoas, mas ao menos ocupam a mente. Eu, que não tenho, assisto a algum filme, leio Quintana, ou qualquer outro poeta, já que é dia de literatura na faculdade e acabo lendo por obrigação e também por gosto. Feriados na quinta são muito bem-vindos, apesar de o sábado e o tédio serem triplicados. Já a sexta, ah... essa sexta! É o dia em que todos se libertam, e só querem esquecer todas as obrigações, todos os problemas, e aqueles que não têm rotina pro fim de semana, saem literalmente da rotina e escolhem esse dia para viver de verdade. Há quem não goste se o dia 13 cair nesse dia. Há quem adore ao seu Deus nesse dia. O fato é que a sexta é um dia com muito sentido, e isso me reconforta.
Os problemas começam no sábado. Reparou que sábado e domingo são tão não úteis que se tornam dias inúteis? A não ser que você adore ao seu Deus num desses dois dias. Mas sempre sobra o outro. Sábado é tedioso. É o dia da ressaca. Do mau humor. Da impaciência. Mas não é pior que o domingo. Eu reservo o domingo pra Deus, e ainda assim ele me deprime. Não por ser de Deus, aliás, de forma alguma!, tampouco por preceder a segunda (em partes). Deprime porque é o dia em que me dou conta do inconformismo do ser humano com as coisas. Trabalha durante a semana, quer descanso, descansa no fim de semana, reclama do nada que se tem para fazer. Reclama tanto da rotina dos dias úteis, mas não aproveita o tempo livre para fazer nada além de reclamar da semana que foi e da que está por vir.
Segunda é um dia que eu incrivelmente adoro. Reclamo, como todo mundo, por voltar à rotina, mas sei que ela é necessária. Pra mim, é revigorante, como primeiro de janeiro. Sim, pasme, eu gosto dela. De quem eu nunca gostei foi da terça-feira. Nem desgostei. É um dia indiferente. Um dia que não representa nada, a não ser que alguma data comemorativa caia numa terça-feira. Mas é um dia mais não útil que o sábado, e mais deprimente que o domingo. Trabalho no modo automático e me deprimo porque a terça não deprime. Não deprime, não alegra, não entristece, não alivia, não faz nada. Ela nem existe na nossa consciência. Deve ser por isso que sempre temos cursos nas terças, consultas médicas, psicanálise, natação, fisioterapia, ou seja lá o que for. Ocupamos as terças com coisas que não podemos – ou não queremos – fazer nos outros dias. Ainda assim, deprimem. Deprimem inclusive quando abrigam um feriado. É só um domingo triplicado. Penso que por essa razão os hispânicos (e os gregos) atribuem a terça-feira 13, ou martes 13, como chamam aqui na Argentina, à má sorte. Compadeceram-se da sua completa inutilidade e resolveram presenteá-la. Parece loucura (e é!), mas já dei muitos sentidos às minhas terças pensaando por que a terça-feira não tem sentido. Quando descobri o martes trece, aliviei. Pelo menos nesse dia a terça ganhou sentido pra mim. O dia de saber que alguém aqui ou na Grécia está reclamando e relacionando todos os problemas da sua vida ao infeliz do martes trece. Não que eu seja supersticiosa, nem que resolva meus problemas, mas daqui em diante, e principalmente quando meu aniversário cair numa quarta, comemorarei os martes treces com alegria e darei descanso pra loucura.

24.9.12

Resposta

ser poesia é
fingir estar perdido
num mundo paralelo 
só observando
vocês se perderem
nessa bagunça vazia
que chamam de realidade.
escrever o que se aprende
é ser poeta.


ser poesia é
fingir estar perdido
num mundo paralelo
sentindo cada gosto e gesto
que vocês não sentem
por estarem perdidos
nessa bagunça vazia
que chamam de realidade.
escrever o que se sente
é ser poeta.


ser poesia é
fingir estar perdido
num mundo paralelo
aprendendo de outros fingidores
o que vocês ignoram
por estarem perdidos
nessa bagunça vazia
que chamam de realidade.
escrever o que se vê
é ser poeta.


17.9.12

Poema de dois versos

Manifesto aqui meu direito de acentuar o cafézinho.
Só toma cafezinho quem toma cafê.

14.9.12

Vida


tem chuva forte que não cessa
tem pancada de verão
tem garoa na manhã de inverno
tem até dia ensolarado
mas olha bem:
não existe céu sem nuvem
e se não chove aqui
chove lá
e se não chove hoje
chove amanhã

11.9.12

melhor que o compromisso
ou a entrega
é o não dizer de ambos
e a certeza do não ter
pra poder fingir um não querer
e nos conquistarmos todo dia

Ao Marcio.